sábado, 13 de dezembro de 2008


Violência ameaça aulas na rede pública
Pedro Rocha Franco - Estado de Minas

Renato Weil/EM/D.A. Press


A sala de aula não é mais o lugar da professora Josemary Hespanha Almeida, de 51 anos. Por causa da rotina de agressões durante os 14 anos em que lecionou na rede pública, o contato com grupos de adolescentes lhe causa fobia, suor e tremedeiras. Em vez de ensinar ciências, como sonhava desde as brincadeiras de criança, ela se limita a tarefas burocráticas no setor administrativo de uma escola da rede municipal de Belo Horizonte. Para controlar o quadro depressivo, se apóia em caixas de medicamentos controlados. A simples possibilidade de retornar à carreira a angustia.

São histórias como a dela que se escondem atrás dos números a que o Estado de Minas teve acesso, e que compõem banco de dados inédito do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) – autarquia ligada ao Ministério da Educação (MEC) – com informações referentes aos ensinos fundamental e médio. Na série Violência diz presente, apresentada nesta Semana da Educação, percorremos quatro estados (Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro e Paraíba) e o Distrito Federal para revelar indicadores e histórias que apontam para o barril de pólvora em unidades do ensino público das cinco regiões do Brasil.

O levantamento mostra que situações como a enfrentada pela professora Josemary se repetem diariamente por todo o país. De acordo com questionário do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), respondido por 11.467 professores da rede pública de ensino, 37,64% dos educadores sofreram alguma forma de violência nas dependências da escola no último ano (veja arte). Uma escalada que vai desde agressões verbais até atentados contra a vida ou alunos assistindo a aulas portando armas de fogo é o que compõe a delicada condição do professor, muitas vezes transformado de autoridade em refém de crianças e adolescentes.

O medo de as ameaças se concretizarem, devido à ligação de muitos alunos com o tráfico de drogas, inibe os professores de prestar queixa policial ou mesmo encaminhar reclamações às secretarias de educação, o que leva à suspeita de que os dados referentes à violência escolar, embora aterradores, são subestimados. Isso torna ainda mais sombrio um quadro em que estudantes agem sem respeitar limites, extrapolando a linha que separa a mera indisciplina do campo da delinqüência.

Nova consulta ao banco de dados do MEC mostra que, questionados se estão satisfeitos em serem professores, 83,25% desses profissionais não hesitam em responder “não”, o que dá uma dimensão de o quanto a educação vem sendo tratada na condição de política pública. A conseqüência direta da soma de desânimo para lecionar, baixos salários, desvalorização profissional e condições precárias de ensino: um país promissor, mas atolado em analfabetismo e no desempenho estudantil aquém do esperado em índices educacionais mundiais.

Mais problema

Por região, em números absolutos, o Nordeste lidera disparado a triste disputa de violência contra professores da rede pública em todas as 10 categorias. Em seguida, o Sudeste: segundo colocado em sete questões, tendo o Norte ocupado a posição nos outros três quesitos – profissionais vítimas de roubo (com uso de violência), alunos freqüentando aulas sob efeito de bebida alcoólica e estudantes portando armas brancas (facas, canivetes etc).

As regiões com menos ocorrências de violência são o Sul e o Centro-Oeste. Entre as possíveis explicações para o dado estão a alta taxa de alfabetização e o maior Índice de Desenvolvimento Humano e Social (IDHS) nos estados sulistas – Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná – e o fato de ser a Região Centro-Oeste (Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal) a menos povoada do país, com 12 milhões de habitantes.

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